DULCE
PONTES ENCHEU PRUDENTIAL HALL
E ENCERROU DA MELHOR MANEIRA
PROGRAMA PORTUGUÊS NO NJPAC
©
Ilídio Martins/Luso-Americano
7 de Junho de 1998
O
programa "Rumos e Sons Portugueses", que integrou o I
Festival Mundial do New Jersey Performing Arts Center (NJPAC),
encerrou quarta-feira passada com um espectáculo que suponho ter
excedido as expectativas do público que encheu completamente o
Prudential Hall. Embora eu esteja convencido que a maioria dos
milhares de portugueses que se deslocou ao NJPAC conhecia pelo
menos um tema ou outro do repertório de Dulce Pontes, porventura
os de maior sucesso, a verdade é que as composições menos
conhecidas acabaram por se impor de tal modo por si próprias que
não vejo razão para o público ter escolhido determinados
"hits" em vez de quaisquer outros que integraram este
concerto. Exceptuando o último tema ("Laurindinha"),
que me pareceu o menos conseguido de todos, não me surpreenderia
que qualquer um dos 17 restantes estivesse à cabeça das
preferências do público em vez dos dois ou três que constituem
a imagem de marca daquela que Amália Rodrigues considerou já
como sua sucessora.
Depois de aqui ter dito que o concerto do Madredeus demonstrou uma
evolução musical da banda de Pedro Ayres Magalhães e que o
espectáculo de Pedro Abrunhosa me pareceu pobre musicalmente (o
público pensou precisamente o contrário dos dois concertos),
parece ter chegado o dia em que estamos todos de acordo. De facto,
o concerto de Dulce Pontes convenceu plenamente todos quantos se
deslocaram ao NJPAC, eu incluído. Se é verdade que as
capacidades vocais de Dulce Pontes não foram para mim uma
surpresa (embora seja nítido um amadurecimento), os arranjos das
18 composições que desfilaram no palco surpreenderam-me
completamente. Tal como já se tinha percebido no repertório que
escolheu para construir uma carreira profissional, os arranjos,
cuja autoria a cantora divide com Guilherme Inês, são de
inegável bom gosto e constituem, para mim, o maior trunfo deste
projecto. Embora não os considere ricos musicalmente por essa
razão, a verdade é que eles foram feitos para alguns
"clássicos" da música portuguesa (casos de "Novo
fado da severa", "Fado português", "Povo que
lavas no rio", "Estranha forma de vida" e "Se
voaras mais ao perto", para citar apenas alguns exemplos), o
que não deixa de ser um exercício arriscado para qualquer
compositor e de ter consequências imprevisíveis. Sobretudo
quando se tem o "despudor" de apagar até ao mínimo
vestígio os ambientes musicais que servem fados como
"Estranha forma de vida" ou "Povo que lavas no
rio", obras que o povo conhece de cor e que os mais
fundamentalistas teriam dificuldade em acreditar que alguém fosse
capaz de semelhante proeza se não o pudessem ver com os seus
próprios olhos. Se é certo que eles continuam perfeitamente
reconhecíveis pela melodia e interpretação, que inclui os bem
característicos maneirismos (com os quais eu embirro), alguns
clássicos do fado nas "mãos" de Dulce Pontes ficaram
tão transfigurados que só por momentos se tornam reconhecíveis.
E aqui não resisto à tentação de desafiar o leitor,
particularmente os amantes do fado, com uma pequena provocação:
depois de toda esta operação de "cosmética" será que
estes dois últimos temas que referi continuam ou não a ser
fados? Por mim não tenho qualquer renitência em dizer que sim. E
até em afirmar, embora eu já não seja o primeiro, que Dulce
Pontes prestou um serviço notável a essa forma muito peculiar de
música portuguesa que se designa por fado. Mas isso levar-nos-ia
para outra discussão, se calhar bem interessante, mas seria fugir
ao assunto que me traz aqui hoje e sobre o qual eu gostaria ainda
de acrescentar, voltando aos arranjos, que só não me entusiasmei
com dois temas: "Fado Português" e
"Laurindinha", o segundo francamente pobre. Entre os
"melhores", eu gostaria de salientar
"Lágrima", de Amália Rodrigues e Carlos Gonçalves,
que me pareceu ser um casamento perfeito entre a composição, a
voz e os arranjos, e "Ondeia", talvez o mais belo de
todos. Fazendo minhas as palavras de um espectador, que desabafou
para um amigo que não se importava de estar toda a noite, eu
também não me importava nada de assistir a um segundo concerto.
Para quem não conhece, Dulce Pontes nasceu no Montijo em Dezembro
de 1969. Frustrada uma carreira como bailarina, aos 16 anos
integra, como vocalista e compositora, um grupo de rock. Após ter
ganho o Festival RTP da Canção, em 1991, e representar Portugal
no mesmo ano no Festival Eurovisão da Canção, Dulce Pontes
grava o seu primeiro álbum um 92 ("Lusitana"), bem ao
estilo anglo-saxónico. Em 93, sob influência de Amália
Rodrigues, regressa ao estúdio para gravar "Lágrimas",
um trabalho que lhe valeu dois disco de platina e o consequente
estrelato. Em 96 lança "Caminhos", um disco com textos
de alguns dos mais importantes poetas portugueses, e um ano depois
colabora com o grupo irlandês "The Chieftains" e
lança-se numa digressão mundial que incluiu, entre outras,
cidades como Tóquio, Barcelona, Sevilha, Madrid, Utrecht,
Tilburg, Bruxelas, Viena, Bona, Estugarda, Roma, Pontevedra, L’Aquila,
Lamezia, Carrara, Joanesburgo, Frankfurt, Toronto, Boston e
Montreal. Embora não conste no currículo qualquer experiência
nessa área, não me espantaria que Dulce Pontes apareça um dia
destes a cantar jazz, já que utilizou neste concerto,
variadíssimas vezes, vocalizações jazzísticas.
Depois de Dulce Pontes, referência para o Grupo de Fados da
Associação dos Antigos Tunos da Universidade de Coimbra (AATUC),
que fez a primeira parte do espectáculo. Durante cerca de meia
hora o público foi brindado com uma boa mão cheia de fados de
Coimbra, alguns dos quais foram calorosamente recebidos (e
aplaudidos) na sala (nomeadamente "Passarinho da
Ribeira" e "Samaritana", cantados por José Paulo).
Pena foi que nem tudo corresse bem, já que os componentes da
AATUC, que integra o citado Grupo de Fados, não conseguiram
esconder a sua revolta pelo escasso tempo de palco que lhes foi
concedido. Segundo um dirigente, a direcção dos AATUC foi
avisada dois dias antes do espectáculo de que dispunha apenas de
meia hora de palco quando esta tinha solicitado cerca de duas
horas para apresentar o programa especialmente preparado para este
evento. De qualquer modo, independentemente das razões que lhe
assistem (ou não), pareceu-me infeliz a ideia de explicar no
palco, imediatamente antes do programa de fados, as razões que os
levaram a encurtar a actuação, ainda por cima com um discurso
que parecia nunca mais acabar. Embora me parecesse imbuído das
melhores intenções, é bom lembrar que o público que se
deslocou àquela sala pagou bilhete para ver um espectáculo e
não para ouvir discursos ou, muito menos, desculpas.
Antes de terminar, uma palavra de desagrado pelos habituais
atrasos dos portugueses, habituados que estão a chegar a desoras
a tudo e mais alguma coisa. Provavelmente não lhes ocorre que
estão a perturbar as pessoas que já se encontram na sala,
impedindo-lhes momentaneamente a visibilidade, obrigando-os a
levantar-se das cadeiras para dar passagem, enfim, incomodando-os.
Além disso, perturbam o próprio espectáculo, o que explica
porque em alguns espectáculos é impedida a entrada do público
após estes terem começado.
Finalmente, uma referência para o que foi este I Festival Mundial
do NJPAC, dedicado à cultura portuguesa e cujo programa foi da
responsabilidade do governo português. Apesar de me parecer que o
objectivo seria abranger as diversas áreas da cultura portuguesa,
nomeadamente no campo musical, pareceu-me flagrante a ausência de
um grupo de música tradicional portuguesa e excessiva a presença
da dança (três companhias, embora todas elas de grande
qualidade). Ainda em matéria de ausências notou-se, pelo menos,
dois nomes grandes da cultura portuguesa: Carlos Paredes e Maria
João Pires, não necessariamente por esta ordem. Mas, apesar
disso, julgo que o I Festival Mundial do NJPAC constituiu o que se
costuma designar por um sucesso, já que deu a conhecer aos
portugueses e americanos que vivem por aqui o que de melhor se faz
em Portugal nas mais diversas formas de expressão artística e
cultural.
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