ILÍDIO MARTINS
página pessoal
Ilídio Martins
  DESABAFOS   TRABALHOS   BLOGUE   Identificação   Contacto
 

SEM REMÉDIO
Newark, New Jersey, 23-10-2001

O Serviço de Informação e Segurança está "minado por desconfianças", politicamente desprezado", "publicamente humilhado" e "não pode descer mais na escala da descredibilização". Os serviços de informação militares idem aspas. A PJ é uma "quinta de poder pessoal" e "uma rede de ilhas em que cada soba dita a vontade que mais lhe convém". O retrato é de Moita Flores ("DN" de 1 de Outubro). Dois dias depois, ainda no "DN", Graça Moura dizia que "as Forças Armadas estão insatisfeitas e a braços com uma crise profunda". Que as forças da ordem estão descontentes e os serviços secretos não funcionam. Enfim, um cenário que me fez lembrar o retrato que Eça de Queirós, n'As Farpas, traçou do então exército e marinha portugueses. Questionando os milhares de contos atribuídos pelo Orçamento de Estado às forças armadas, Eça começa por dizer, do exército, que o armamento "é inteiramente ineficaz". E logo a seguir acrescenta: "Está provado cientificamente que, depois de meia hora de fogo, as espingardas do exército passariam para o inimigo - rebentadas em estilhaços. Quando não rebentem, o seu alcance é humanitário. Queremos dizer - as balas ficam a meio caminho do inimigo." Prossegue o retrato demolidor: "Verdadeiramente o nosso exército só poderia alcançar o inimigo - correndo atrás dele: mas para isso faltam-lhe sapatos!" A artilharia, por exemplo, era uma vergonha: "há um só meio de ela prejudicar o inimigo: é fazê-lo prisioneiro, colocá-lo amarrado a quatro palmos da peça, procurar não errar o tiro, e conseguir assim inutilizar-lhe a barretina!" Pouco ou nada havia que se aproveitasse: "O equipamento é nulo. Nem tendas, nem cantinas, nem transportes." Para cúmulo, os regimentos não tinham instrução nem pontaria. Restava "o bom senso fechado, a fronteira aberta, e umas peças de artilharia a que deu fogo Camões - o que é poético, mas frágil!" Na marinha, pouco mais havia que "uns poucos de navios defeituosos, velhos, decrépitos, quase inúteis, sem artilharia, sem condições de navegabilidade, com cordame podre, a mastreação carunchosa (...)." As embarcações estavam uma lástima. A Pedro Nunes, por exemplo, estava em tal estado que, vendida, dava "uma soma que o pudor nos impede de escrever." Mas foi dando uma ideia: "O Estado pode comprar um chapéu no Roxo com a Pedro Nunes - mas não pode pedir troco." Havia outras com estranhas manias: "A Mindelo tem um jeito: deita-se. No mar alto, todas as suas tendências, todos os seus esforços são para se deitar. Os oficiais de marinha que embarcam neste vaso fazem disposições finais. A Mindelo é um esquife - a hélice." E as que se cansavam depressa: "A Napier saiu um dia para uma possessão (...) mas exausta, não quis, não pôde voltar. Pediu-se-lhe, lembrou-se-lhe a honra nacional, citou-se-lhe Camões, o Sr. Melício, todas as nossas glórias. A Napier insensível, como morta, não se mexeu." Enfim, a esquadra portuguesa estava reduzida a "uma colecção de jangadas disfarçadas!" Uma humilhação nacional: "este grande povo de navegadores acha-se reduzido a admirar o vapor de Cacilhas!" Ainda se tentou modernizar a frota. O Governo português, "morgado de província ingénuo e generoso", comprou por mil libras a corveta Hawks aos ingleses, que a tinham posto à venda pelo valor da madeira. Mas quando a quis usar, "desfez-se-lhe nas mãos!" Tentou-se, depois, construir, mas o Arsenal não tinha "nem oficinas, nem instrumentos, nem engenheiros, nem organização, nem direcção." O resultado seria um desastre: com "idade de meses, tinha o fundo podre!" Gastou-se 87 contos no conserto mas, estranhamente, o fundo voltou a apodrecer. Podridão que, recorda, "começava a apresentar-se com um carácter de insistência verdadeiramente antipatriótica!" Enfim, a fama dos portugueses chegou longe: "Os engenheiros em Inglaterra já se não aproximavam dos navios portugueses senão em bicos de pés - e com o lenço no nariz." Humilhado, o Arsenal tentou a modalidade da lancha. Novo desastre: "Lança-se ao Tejo, alegria nacional, colchas, foguetes, bandeirolas... E a lancha não anda!" De repente começou a mover-se. Só que não como se esperava: "A lancha recuava. Era uma brisa que a repelia. Em todas as experiências a lancha recuava com extrema condescendência: brisa ou corrente tudo a levava, mas para trás. Para diante, não ia. (...) O Arsenal tinha feito uma lancha a vapor que só podia avançar - puxada a bois. O País riu durante um mês."

© Direitos Reservados.
Não é permitida a reprodução destes textos
em qualquer outro meio de difusão.

Até Já • 13-01-2011
Falhanço Total • 16-10-2010
Escrevedores & Publicantes • 22-10-2010
Monstruosidades • 13-09-2010
Pragas • 09-08-2010
Fora de Jogo • 01-06-2010
Uma Derrota Anunciada • 31-05-2010
Maquinações • 06-04-2010
Chegámos à Madeira • 15-03-2010
Coisas Simples • 11-02-2010
Independências • 15-01-2010
Fados e Guitarradas • 11-12-2009
Real e Virtual • 17-11-2009
Balelas Saramaguianas • 21-10-2009
Cronistas • 01-10-2009
O Futuro do Livro • 01-09-2009
Putas e Submissas • 05-08-2009
Eleitos e Nomeados • 06-07-2009
Pragmatismo e Variações • 11-06-2009
Sal a Mais • 14-05-2009
O Engodo • 21-04-2009
Pornografia II • 11-03-2009
Pornografia I • 11-03-2009
Holocausto • 19-02-2009
Da Liberdade 28-01-2009
Pacifistas 07-01-2009
Papagaios 11-12-2008

Da Impunidade 19-11-2008
O Mal Menor 28-10-2008

Manjedouras • 16-10-2008
Fátima Felgueiras • 24-09-2008
E As Crianças, Senhor? • 05-09-2008
Uma Tragédia
• 12-08-2008
Pensamento Único • 30-07-2008
Moralistas da Bola
• 25-06-2008
Uma Lição • 04-06-2008
Racismo
• 14-05-2008
Jardim • 21-04-2008
O Descalabro
• 01-04-2008
Professores • 12-03-2008
Obama
• 29-02-2008
Bater no Ceguinho • 11-02-2008
Morrer Saudável
• 18-01-2008
Das Boas Intenções • 26-12-2007
Falar Claro
• 09-12-2007
Desacordo Ortográfico • 16-11-2007
Aldrabices
• 19-10-2007
Directas • 05-10-2007
Memória Curta
• 20-09-2007
Cereal Killers • 30-08-2007
Esquerda e Direita
• 11-08-2007
Leituras de Verão • 21-07-2007
Factos e Suposições
• 10-07-2007
Vacas Sagradas • 19-06-2007
Madeleine
• 29-05-2007
O Canudo • 08-05-2007
Sabichões
• 19-04-2007
Grandes Portugueses • 28-03-2007
Jornalismo e Blogosfera
• 05-03-2007
O Pior Cego • 16-02-2007
Esmeralda
• 26-01-2007
O Aborto • 09-01-2007
Apito Dourado
• 18-12-2006
Lixo • 29-11-2006
O Embuste
• 09-11-2006
Crime e Castigo • 19-10-2006
Islão Moderado
• 28-09-2006
Evidências • 14-09-2006
Günter Grass
• 25-08-2006
Bom Senso • 04-08-2006
Rescaldo
• 17-07-2006
Frontalidade • 29-06-2006
Vergonha
• 12-06-2006
Scolari, Outra Vez • 22-05-2006
Estrelas
• 02-05-2006
Era o Vinho • 13-04-2006
A Feira
• 23-03-2006
Mamarrachos • 06-03-2006
Caricaturas
• 14-02-2006
Leituras • 24-01-2006
Sharon
• 06-01-2006
Do Outro Mundo • 16-12-2005
Incompetências
• 29-11-2005
Somos Todos Franceses • 10-11-2005
Scolari
• 24-10-2005
Porto Caseiro • 05-10-2005
O Manuel
• 15-09-2005
Zanga de Comadres • 30-08-2005
Actores
• 15-08-2005
Verão Quente • 29-07-2005
Basta!
• 06-07-2005
Revisão Prévia • 23-06-2005
Música
• 09-06-2005
Fitas • 20-05-2005
Lagartixas e Jacarés
• 03-05-2005
Coisas Simples • 15-04-2005
A Puta da Vida
• 25-03-2005
Hipocrisia • 10-03-2005
O Código
• 23-02-2005
Boatos e Insinuações • 07-02-2005
Foguetório
• 22-01-2005
A Lamúria • 06-06-2005
Um Clássico
• 17-12-2004
Antes Que Seja Tarde • 01-12-2004
O Medo
• 14-11-2004
Peixeiradas • 28-10-2004
Marcelo
• 10-10-2004
Sem Perdão • 24-09-2004
A Triste Realidade
• 09-09-2004
Fahrenheit 9/11 • 12-08-2004
Ressentimento
• 30-07-2004
As Regras do Jogo • 14-07-2004
Bandeiras
• 29-06-2004
Casa Pia
• 13-06-2004
Saddam • 24-05-2004
O Sistema
• 07-05-2004
Europeias • 21-04-2004
O Circo
• 06-04-2004
O Terrorismo • 22-03-2004
Ferreira Torres
• 05-03-2004
Tenho Dúvidas • 19-02-2004
Mourinho • 03-02-2004
O Fado • 19-01-2004
Droga
• 05-01-2004
O Brasil • 19-12-2003
Histórias
• 04-12-2003
Ler Ou Não Ler • 19-11-2003
O Benfica
• 03-11-2003
Culpados e Inocentes • 17-10-2003
Árbitros
• 03-10-2003
Primário • 19-09-2003
Chover no Molhado
• 05-09-2003
Cruzadas • 21-08-2003
Fogo Posto
• 06-08-2003
Ser ou Não Ser • 24-07-2003
Trabalho Político
• 09-07-2003
Equívocos • 24-06-2003
O Sucesso dos Outros
• 09-06-2003
O Meu Cão • 24-05-2003
O Manifesto
• 08-05-2003
Mentiras • 23-04-2003
As Vítimas
• 08-04-2003
Os Médicos • 31-03-2003
O Professor
• 14-03-2003
Mexer na Dita • 06-03-2003
A Guerra
• 24-02-2003
Vital • 09-02-2003
A Banda
• 28-01-2003
O Crime Compensa
• 13-01-2003
A Campanha
• 31-12-2002
Lágrimas de Crocodilo • 16-12-2002
Suspeitas
• 02-12-2002
A Mediocridade
• 18-11-2002
O Futebol
• 03-11-2002
Os Palermas
• 18-10-2002
A Divina Providência • 02-10-2002
Disparates • 13-09-2002
Tudo Normal
• 30-08-2002
O Escaldão
• 14-08-2002
Justiça
• 30-07-2002
Incompatível • 16-07-2002
Vergonhas
• 01-07-2002
Bestas
• 14-06-2002
O Último a Rir • 02-06-2002
RTP • 18-05-2002
Margaridas • 10-05-2002
Causas
• 27-04-2002
Olha o Que Eu Digo
• 12-04-2002
Barroso • 29-03-2002
A Imagem • 15-03-2002
A Carta
• 04-03-2002
Monteiro
• 17-02-2002
Portugal de Fachada • 01-02-2002
A Ilusão
• 25-01-2002
Gato Por Lebre
• 14-01-2002
Menos Que Zero
• 04-01-2002
A Lista • 28-12-2001
Um Manguito
• 20-12-2001
Misérias
• 08-12-2001
O Progresso
• 27-11-2001
Intelectuais da Treta • 17-11-2001
Políticos
• 09-11-2001
Coincidências • 31-10-2001
Sem Remédio
• 23-10-2001
Matar Ou Morrer • 15-10-2001
São Rosas • 07-10-2001
Auto Deixa Andar • 30-09-2001
Impossível • 20-09-2001
Xutos e Pontapés • 08-09-2001
Cão Que Ladra • 25-08-2001
Jornalismo de Referência • 10-08-2001
O Chão da Política • 04-08-2001
Politiquice • 25-07-2001
Conversa em Família • 20-07-2001
Estamos Perdidos • 10-07-2001
Os Nervos da Justiça • 01-07-2001
Agora É Que Vai Ser • 21-06-2001
Air Portugal • 15-06-2001
Um Abuso • 05-06-2001
Auto Quê? • 23-05-2001
Livro Electrónico • 14-05-2001
Abril • 01-05-2001
Areia na Engrenagem • 19-04-2001
Bastonadas • 05-04-2001
Benza-os Deus • 29-03-2001
Ridículo • 22-03-2001
Uma Desgraça • 14-03-2001
Revista à Portuguesa • 08-03-2001
Os Donos da Bola • 27-02-2001
A Técnica da Linguiça • 20-02-2001
Esmola ao Ceguinho • 13-02-2001
Meu Caro Herberto • 06-02-2001
Rangel Brother • 30-01-2001
A Lógica da Batata • 23-01-2001
Os Negócios do FSE • 16-01-2001
Gazeta Regional • 08-01-2001
Casa do Douro • 04-01-2001
Produtores de Conteúdo • 26-12-2000
Falemos de Sexo • 18-12-2000
Pérolas a Porcos • 11-12-2000
Acreditar em quê? • 04-12-2000
A Mama do Costume • 27-11-2000
Piriquitos • 20-11-2000
Saramago • 13-11-2000
Muito Obrigado • 07-11-2000
Até ao Meu Regresso • 01-08-2000
Confessionário • 27-07-2000
Sexo em Competição • 21-07-2000
Bailinho da Madeira • 16-07-2000
A Vítima • 11-07-2000
Porca Miséria • 05-07-2000
Fátima e Futebol • 30-06-2000
Direitos Humanos • 25-06-2000
A Valsinha • 20-06-2000
Um Disparate • 15-06-2000
Então é Assim • 10-06-2000
Música Quê? • 05-06-2000
O José • 01-06-2000
Cavaco Out • 27-05-2000
César Augusto • 23-05-2000
O Segredo • 19-05-2000
América • 15-05-2000
Espectacular • 10-05-2000
Deputados • 06-05-2000
Subornos • 02-05-2000
Small Show Sic • 28-04-2000
Um Nojo • 24-04-2000
Sinais de Fumo • 19-04-2000
Grande Reportagem • 15-04-2000
Mulheres • 10-04-2000
Pecados • 05-04-2000
Bonecos • 31-03-2000
Poetas • 27-03-2000
Indignações • 24-03-2000
Artistas • 21-03-2000
Enganos • 17-03-2000
Palavra de honra • 13-03-2000
Conselho • 09-03-2000
Fumo • 07-03-2000
Jardineira • 02-03-2000
Peixeirada • 01-03-2000
Tiros na Madeira • 24-02-2000
Ignorâncias • 21-02-2000
O 400º homicídio • 17-02-2000
Nuclear • 16-02-2000
Semanário Transmontano • 14-02-2000
Água Benta • 13-02-2000